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«Nesta terra quem não rema já remou, quem não cava já cavou.» O ditado é aldeano e traduz bem a ligação que havia entre o rio, a terra e as gentes. Mas, mais do que isto, é também a expressão exacta de uma terra que pulsava ao ritmo do trabalho.
A localização privilegiada de Aldegalega do Ribatejo colocou-a na rota de Lisboa e, por isso, desde cedo, se desenvolveu o transporte a ligar as duas margens do Tejo. Os mareantes tiveram, então, posição importante em Aldegalega. Por outro lado, em redor da vila, os terrenos eram cultivados e, a partir do século XIX, a criação e comercialização de carne de porco passaram também a pautar o ritmo da economia da vila.
As capelas instituídas na Igreja do Divino Espírito Santo pelos mareantes e os “homens da terra” simbolizam bem a importância destes dois grupos.
O rio, como fonte de vida, foi também fonte de sustento dos aldeanos e montijenses. Segundo José de Sousa Rama, no início do século XX, Aldegalega do Ribatejo tinha uma população de quatrocentos pescadores, mas cuja actividade se dividia entre o rio e a agricultura. Atendendo à pequenez das embarcações e ao modo como pescavam, os pescadores, usualmente, deixavam a faina no Inverno procurando então o seu sustento nas chacinarias ou na agricultura.
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O rio era vivo. Um pescador conta que, naquele tempo, «havia tantas corvinas como pedras numa calçada». Por outro lado, há registos da intervenção das autoridades para afastar os botos (golfinhos) que dizimavam os peixes deste braço do rio.
A introdução do barco a vapor, no século XIX, e a construção da Ponte 25 de Abril, já nos nossos dias, contribuíram decisivamente para que o rio deixasse de ser sulcado por varinos, faluas ou fragatas e os “mareantes” ficassem reduzidos aos marinheiros da Transtejo. No início do século XX cinquenta botes, três faluas e um barco a vapor asseguravam a ligação Montijo/Lisboa/Montijo.
Numa população de dez mil almas, Aldegalega, no início do século XX, além dos quatrocentos pescadores, tinha seis mil fazendeiros e trabalhadores agrícolas, vinte tanoeiros, trinta sapateiros, trinta carpinteiros, três ferradores, quarenta pedreiros, sete latoeiros, seis alfaiates, vinte barbeiros, e doze serralheiros.
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Além destes trabalhadores, outros havia, em número não determinado, que animavam cinco cerâmicas, uma fábrica de azeite de purgueira, uma fábrica de tijolos, uma fábrica de cera, outra de aguardente e outra ainda de adubos químicos. Havia também um lagar de azeite, um matador municipal e vinte quintais, isto é, chacinarias ou matadouros particulares, vinte e seis salinas, três talhos e duas vacarias. Dois hotéis abrigavam os forasteiros e três restaurantes estavam à disposição da população.
Assim era o Montijo no princípio do século XX.Por: Rui Aleixo